
Imagine um país em que a primeira-dama não foi eleita, não possui cargo público, não responde oficialmente a nenhum ministério, mas mesmo assim atua como chefe de Estado, com livre acesso à máquina pública e a cofres que, supostamente, pertencem ao povo. Um país onde a transparência é exigida do padeiro da esquina, mas tratada como favor gracioso quando envolve as viagens de luxo de uma cônjuge presidencial. Bem-vindo ao Brasil de Janja.
A matéria da revista Crusoé, publicada no último dia 4, escancara o que nós, cidadãos atentos e inconformados, já desconfiávamos há tempos: o novo padrão ético da esquerda no poder não é mais “rouba, mas faz”, mas sim “não tem cargo, mas manda”. E manda muito.
Sob o título burocrático e aparentemente bem-intencionado de “As novas regras para as viagens de Janja”, a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu um parecer que deveria, em teoria, colocar ordem nos gastos e compromissos de Janja da Silva, esposa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema? O parecer, ao invés de impor limites, praticamente autoriza o desatino institucional.
A decisão da AGU determina que as despesas com passagens, diárias e deslocamentos da primeira-dama deverão ser publicadas no Portal da Transparência. Até aí, ótimo. A transparência é um princípio basilar de qualquer democracia madura. Mas quando se lê nas entrelinhas — algo que a Crusoé faz com elegância e precisão —, a mensagem que salta é outra: Janja vai continuar fazendo o que quiser, com dinheiro público e sem prestar contas a ninguém.
Sim, leitor. Lula não só não impôs limites, como ratificou o poder informal da esposa, que agora poderá atuar “simbolicamente” em eventos políticos, diplomáticos e culturais. É como se uma mulher que nunca recebeu um voto sequer passasse a agir como embaixadora, chanceler e ministra de Relações Exteriores, tudo ao mesmo tempo. E o mais grave: sem ser responsabilizada por absolutamente nada do que diz ou faz.
Aparentemente, os tempos em que as esposas presidenciais mantinham uma postura discreta, institucional e respeitosa acabaram com Michelle Bolsonaro. Janja parece ter vindo com uma agenda própria — e não falo apenas de compromissos oficiais, mas de uma agenda ideológica camuflada em discursos feministas de ocasião, como o que Lula deu em Hanói, no Vietnã:
“Ela vai continuar fazendo o que ela gosta. Porque a mulher do presidente Lula não nasceu para ser dona de casa. Ela vai estar aonde ela quiser, vai falar o que ela quiser e vai andar para onde ela quiser.”
Em outras palavras: “Ela faz o que quiser, com o seu dinheiro, contribuinte brasileiro.” Simples assim.
E se você achou que esse empoderamento presidencial simbólico não custa caro, sente-se. Em março, o governo gastou R$ 18 mil em diárias para que quatro assessores acompanhassem Janja em Paris. Tudo isso para que ela representasse o Brasil na Cúpula Nutrição para o Crescimento (N4G). O nome do evento soa bonito, mas o impacto da viagem é, até agora, inexistente. Nenhuma política pública resultou da presença da primeira-dama. Nenhum relatório, nenhuma ação concreta. Apenas fotos e sorrisos — que nem sequer foram postados nas redes sociais oficiais, como se o compromisso diplomático tivesse virado um passeio privado em nome da fome alheia.
E não para por aí. No mês anterior, foram R$ 34 mil gastos com passagens em classe executiva para que a primeira-dama voasse até Roma, compondo uma comitiva de 13 pessoas — repetindo, ela não possui nenhum cargo oficial no governo. O que estamos vendo é a institucionalização do “faz de conta institucional”: faz de conta que ela é ministra, faz de conta que ela é diplomata, faz de conta que é representante do Estado. Só o que não é ficção são os gastos públicos, que nós, cidadãos reais, pagamos em reais muito reais.
Mas sejamos justos. A decisão da AGU tem um lado positivo: agora saberemos — com algum atraso, claro — quanto custa manter Janja em seu tour diplomático global. Isso, no entanto, não é mérito do governo, mas pressão da opinião pública e de órgãos independentes que exigem explicações mínimas. É como se o governo dissesse: “Já que vocês querem saber, então vamos mostrar. Mas ela vai continuar viajando, porque a primeira-dama gosta disso.”
O ponto aqui, meus caros leitores, não é moralismo barato ou implicância com a esposa do presidente. O problema é muito mais sério: trata-se da violação deliberada da liturgia do cargo, da quebra das barreiras institucionais e do aparelhamento pessoal do Estado por parte de uma figura que nem sequer foi nomeada. Estamos vendo o surgimento de uma espécie de “presidência paralela”, onde os limites entre o público e o privado são perigosamente borrados.
Não é exagero. E o contexto internacional nos ajuda a entender o risco. Vejam os Estados Unidos. Nenhuma primeira-dama, nem mesmo Michelle Obama ou Jill Biden, ousou ocupar espaços que são constitucionalmente reservados ao presidente ou ao corpo diplomático. Lá, as esposas presidenciais podem ser influentes, claro — mas sempre de forma simbólica e respeitosa. Aqui, a diferença é gritante: Janja é tratada como autoridade pública sem sê-lo, inclusive com declarações oficiais e compromissos pagos com dinheiro do povo.
E aqui, permitam-me uma especulação jornalística que muitos dos meus colegas têm medo de fazer: estamos vendo o ensaio de uma futura candidatura presidencial? Não se espantem se, em 2026 ou 2030, Janja aparecer como o “plano B” do PT. Seria a repetição tropical do que Cristina Kirchner fez na Argentina. Quando os escândalos e a rejeição tornam o líder inviável, surgem as esposas como salvadoras do legado — ou do projeto de poder.
E quem perde com isso? Nós, brasileiros. Perdemos em institucionalidade, em responsabilidade fiscal, em seriedade no trato com o dinheiro público. Enquanto milhões de brasileiros lutam para pagar o aluguel, a luz e a cesta básica, a primeira-dama desfila em Paris e Roma como se fosse embaixadora oficial da República. Não há um pingo de sensibilidade social nesse roteiro. É um retrato claro do elitismo disfarçado de engajamento social que a esquerda adora exibir: falam em povo, mas vivem cercados de assessores, mordomias e jatinhos pagos pelo mesmo povo que dizem defender.
A verdade, infelizmente, é essa: o Brasil virou palco de uma farsa institucional, onde a figura da primeira-dama se tornou símbolo do aparelhamento, da irresponsabilidade e da arrogância de um governo que não vê limites quando se trata de seus próprios caprichos.
É por isso que textos como o da Crusoé são tão importantes. Eles não apenas informam. Eles desnudam o cinismo palaciano, revelando aquilo que muitos fingem não ver: um governo que não governa, mas encena. Um governo que usa a imagem da esposa do presidente como cortina de fumaça para esconder seus próprios fracassos e autoritarismos.
E se você pensa que isso tudo é apenas um problema de estilo ou protocolo, pense de novo. O uso da máquina pública por quem não tem mandato, cargo ou responsabilidade jurídica é uma afronta direta à democracia. E é por isso que nós, conservadores, não podemos nos calar. Devemos denunciar, expor e pressionar por mudanças reais.
Não se trata de atacar Janja como pessoa. Trata-se de defender a integridade das instituições. Se queremos um Brasil sério, precisamos exigir que cada um cumpra seu papel, e que ninguém se arrogue funções para as quais não foi escolhido nem nomeado.
E, por fim, deixo uma pergunta que não quer calar: se Michelle Bolsonaro tivesse feito 1% disso, o que você acha que a imprensa estaria dizendo hoje? Pois é. Pense nisso. E tire suas próprias conclusões.
Com informações Crusoé