PL 1354/21 pode agravar os desertos de notícias no Brasil e sufocar o jornalismo, alerta o Instituto Sivis

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Vivemos uma era onde a informação deixou de ser privilégio das bancas de jornais e se espalhou pelos dedos que deslizam nas telas dos smartphones. As plataformas digitais democratizaram o acesso ao conteúdo, sim, mas com isso trouxeram consigo um novo desafio: a sobrevivência dos pequenos veículos de imprensa. O jornalismo, antes financiado por assinaturas, publicidade e apoio comunitário, hoje depende de algoritmos, curtidas e visualizações. É nesse cenário caótico, onde poucos dominam a atenção de muitos, que surge o PL 1354/21, apresentado pelo ex-deputado Denis Bezerra (PSB-CE), supostamente com a intenção de corrigir distorções do mercado e promover a sustentabilidade do setor jornalístico. Mas, como bem expôs o artigo original do Instituto Sivis, publicado na Gazeta do Povo, o que se apresenta como solução pode, na prática, ser um verdadeiro veneno lento para a pluralidade da informação no Brasil.

A proposta do projeto é simples na superfície, mas perigosa na essência: tornar obrigatória a remuneração de jornais pela exibição de seus conteúdos em plataformas digitais. A justificativa? Corrigir o desequilíbrio de poder entre os gigantes tecnológicos e os veículos de imprensa que, ao terem seus conteúdos compartilhados, estariam sendo explorados sem contrapartida financeira. Um argumento tentador, não é? Afinal, quem não quer ver os grandes conglomerados digitais pagando por algo que lhes dá lucro? Contudo, como ensina a sabedoria popular, o diabo mora nos detalhes.

O projeto, ao estabelecer critérios de remuneração baseados no volume de conteúdo, na audiência e no número de contratações formais, simplesmente favorece quem já domina o mercado: os grandes grupos de mídia. E aí está o primeiro grande problema. As pequenas redações, os jornais locais, os sites regionais — aqueles que ainda se esforçam em dar voz a cidades esquecidas, em fiscalizar políticos municipais, em manter a comunidade informada — esses ficarão de fora. Porque a lógica de mercado que sustenta o PL é a mesma que já hoje concentra a verba publicitária em poucos bolsos.

É como se dissessem: “Vocês podem até produzir jornalismo, mas se não tiverem audiência suficiente, não serão pagos por isso.” O que se ignora nessa conta fria é o valor social da informação local. A matéria do Instituto Sivis nos lembra que metade dos municípios brasileiros não possui veículos de comunicação locais. Isso mesmo, metade. Esses espaços são chamados de “desertos de notícias”, regiões onde a população vive à margem do direito constitucional à informação. E se o PL 1354/21 for aprovado da forma como está, o que é um deserto hoje, pode se tornar um abismo amanhã.

Porque os incentivos propostos só alimentam quem já tem estrutura para crescer. O pequeno site que cobre a câmara de vereadores de uma cidadezinha no interior do Pará? Vai continuar lutando com o chapéu na mão. O jornal digital independente que denuncia irregularidades no sertão nordestino? Vai ser ignorado pelos algoritmos da nova lei. O PL 1354/21, com suas boas intenções, está prestes a sufocar as iniciativas que ainda mantêm viva a chama do jornalismo de proximidade, aquele que conversa com o povo, que entende os problemas da comunidade, que é, afinal, o verdadeiro pilar de uma democracia representativa.

Outro ponto alarmante levantado pelo texto do Instituto Sivis é a concentração geográfica dos empregos formais em jornalismo. Segundo a RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), a esmagadora maioria desses empregos está nos eixos Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Ora, se um dos critérios para remuneração é o número de contratações formais, então o dinheiro vai seguir para onde já há concentração de recursos e poder. Em outras palavras, o Brasil profundo — aquele que vai além do asfalto, das câmeras de estúdio e dos editoriais de grandes jornais — ficará ainda mais à margem.

A ironia cruel é que o projeto que se apresenta como defensor do jornalismo pode ser justamente o algoz daqueles que ainda tentam praticá-lo longe dos holofotes das capitais. Porque o problema do jornalismo brasileiro não é só a falta de remuneração pelos gigantes da tecnologia, mas sim a falta de incentivo a quem realmente precisa dele. Uma legislação justa deveria considerar mecanismos que favorecessem os pequenos, que aliviassem os encargos sobre veículos regionais, que incentivassem a inovação fora dos grandes centros. Mas não é isso que está no papel.

Pior ainda, estamos diante de um cenário em que a regulação do jornalismo se dá com uma mão pesada demais e sem sutileza para distinguir entre os diferentes contextos e realidades. A intenção declarada do PL — garantir sustentabilidade — só é válida se considerar a pluralidade do ecossistema jornalístico. Caso contrário, estaremos criando uma elite da informação, onde poucos falam e muitos apenas escutam.

Há quem defenda que o projeto poderia ser emendado, ajustado, aprimorado. E essa é, talvez, a esperança mais razoável. Porque, como bem destacou o artigo da pesquisadora Fernanda Trompczynski, é possível sim pensar em critérios mais equitativos, que incentivem os veículos de menor porte e atuação regional. Por que não pensar em faixas de remuneração que considerem a relevância social do conteúdo, e não apenas seus números brutos? Por que não criar mecanismos de incentivo fiscal, linhas de financiamento e capacitação para iniciativas jornalísticas locais? Por que não tratar de forma desigual os desiguais, como exige o bom senso e a verdadeira justiça?

O PL 1354/21, do jeito que está, aprofundará as desigualdades regionais e ampliará a distância entre o que se diz ser jornalismo e o que realmente informa o cidadão comum. Isso, para um país que já sofre com a baixa qualidade da educação, a desinformação e a polarização política, é simplesmente perigoso demais. Não é exagero dizer que estamos diante de um divisor de águas para o jornalismo nacional.

Precisamos de um debate maduro, técnico e plural sobre o futuro da informação no Brasil. Isso significa ouvir os pequenos, os independentes, os regionais, e não apenas os executivos de grandes redações ou os porta-vozes das big techs. Significa reconhecer que a liberdade de imprensa não se resume a um direito abstrato, mas se concretiza no cotidiano das comunidades que precisam saber o que está acontecendo em sua rua, em sua cidade, em seu estado.

Portanto, antes de nos rendermos ao discurso fácil de que o PL 1354/21 é a salvação do jornalismo, é preciso encarar o projeto com a seriedade que ele exige. Porque, muitas vezes, os piores inimigos da liberdade são aqueles que se apresentam como seus maiores defensores. E quando o remédio tem mais efeitos colaterais do que benefícios, talvez o melhor seja repensar toda a prescrição.

O Brasil não precisa de mais concentração. Precisa de mais vozes. Mais diversidade de opiniões. Mais pluralidade de fontes. E isso só se alcança com incentivo aos pequenos, com respeito à informação local, com estímulo à inovação fora dos grandes centros. Qualquer legislação que ignore isso não está promovendo jornalismo — está enterrando o pouco que ainda resta dele no interior do país.

É hora de abrir os olhos. Porque se deixarmos passar, o que hoje é um “deserto de notícias” poderá, em breve, tornar-se um vazio democrático. E nesse silêncio, quem vence não é o cidadão. É o poder. Sempre ele.

Com informações Gazeta do Povo

Leandro Veras

Editor do Conservadores Online, é cristão, conservador e analisa os bastidores da política com visão crítica e firmeza.

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