
Ah, o Supremo Tribunal Federal, essa verdadeira torre de marfim onde ministros pairam acima do bem e do mal, decidindo o destino da nação com uma imparcialidade digna de um oráculo grego – ou pelo menos é assim que querem que você acredite. Pois bem, Luís Roberto Barroso, o iluminado presidente da corte, resolveu que Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin não estão impedidos de julgar Jair Bolsonaro. Que surpresa, não? Quem poderia imaginar que aqueles que demonstraram aversão aberta ao ex-presidente e tudo que ele representa poderiam ser considerados isentos? Nem o mais ingênuo dos observadores poderia cair nessa narrativa risível.
Barroso, sempre ele, com sua retórica envolvente e seu domínio da hermenêutica conveniente, alegou que a petição da defesa de Bolsonaro não se enquadra no artigo 252 do Código de Processo Penal. Quer dizer, se não está literalmente escrito no código que um ex-advogado de Lula e um ex-ministro de um governo adversário estão impedidos de julgar o principal oponente político do establishment, então está tudo certo. Afinal, interpretação extensiva só vale quando é para enfiar conceitos elásticos como “atos antidemocráticos” em decisões monocráticas, não é mesmo?
E por falar em parcialidade escancarada, Flávio Dino nos brinda com uma explicação de fazer corar até um estagiário de direito. O sujeito que já processou Bolsonaro pessoalmente e fez questão de exibir sua militância desenfreada agora tenta vender a ideia de que não há “presunção automática de parcialidade”. Claro, porque um ministro que já declarou guerra política ao réu não poderia, de forma alguma, estar motivado por interesses pessoais. Só pode ser coincidência que Dino já tenha julgado 329 casos relacionados ao 8 de janeiro e, veja só, só agora se discute sua suspeição. Um timing perfeito para alegar “preclusão lógica”, como se um erro reiterado ao longo de meses de julgamentos arbitrários justificasse sua continuidade.
E então temos Cristiano Zanin, que convenientemente esquece que foi advogado de Lula, o maior beneficiário direto da perseguição política a Bolsonaro. Ele se esforça para minimizar seu envolvimento nas eleições de 2022, dizendo que tudo se deu “estritamente no âmbito técnico-jurídico”. Engraçado como essa tal tecnicidade sempre tem um viés político muito bem definido, não? Mas, segundo ele, não há qualquer conexão entre sua atuação anterior e os processos atuais. Deve ser coincidência que seus pareceres e decisões soem como se fossem redigidos no gabinete de um certo ex-presidente condenado e descondenado por essa mesma Suprema Corte.
Para dar aquele toque final de ironia, Barroso também rejeitou o pedido de Braga Netto para declarar a suspeição de Alexandre de Moraes, o homem que, sozinho, conseguiu concentrar mais poder do que qualquer ministro na história democrática do país. Afinal, como poderia Moraes ser suspeito? O fato de ele ter conduzido investigações persecutórias contra apoiadores de Bolsonaro, censurado veículos de comunicação, prendido adversários políticos sem condenação e ignorado qualquer princípio básico de imparcialidade não significa nada, certo? Apenas uma grande coincidência.
O argumento de Barroso é quase cômico, se não fosse trágico: Dino e Zanin não se consideram impedidos, então está tudo bem. Ah, claro! Agora o próprio juiz decide se ele é parcial ou não. Que belo sistema de justiça. É como se um réu pudesse simplesmente declarar a própria inocência e, pronto, caso encerrado. “Não há demonstrações concretas de interesse pessoal no caso julgado”, dizem eles. Bom, se não for o próprio réu a escrever uma confissão explícita dizendo “sim, sou parcial”, então estamos diante de juízes absolutamente neutros.
Mas não para por aí. Os advogados de Bolsonaro ainda tentaram, ingenuamente, buscar uma definição sobre qual colegiado deveria julgar o caso – se o plenário inteiro ou apenas uma turma de cinco ministros. Mas Barroso, sempre ágil em evitar discussões inconvenientes, decidiu que esse “não é o procedimento adequado” para levantar tal questão. Ou seja, o processo judicial brasileiro se tornou um jogo onde as regras são definidas conforme a necessidade política do momento. A cada nova jogada, a Suprema Corte redefine os critérios, garantindo que o desfecho seja sempre o mesmo: condenação de adversários e blindagem de aliados.
Se há algo que esse episódio escancara é que a imparcialidade no STF morreu há muito tempo, se é que um dia existiu. O que vemos hoje é um tribunal que mais parece um diretório partidário, onde ministros julgam com base em convicções políticas e não em evidências jurídicas. Moraes, Dino e Zanin são apenas peças de um xadrez maior, onde as regras são manipuladas conforme a conveniência do momento. Barroso, como grande maestro dessa orquestra desafinada, se esforça para dar um verniz de legalidade a decisões que fariam qualquer democrata verdadeiro sentir vergonha.
O problema é que essa farsa já não engana mais ninguém. O brasileiro médio, aquele que trabalha, paga impostos e quer um país justo, percebe a cada dia que as instituições que deveriam garantir a democracia são, na verdade, as que mais a destroem. Quando ministros do STF ignoram a lei para perseguir adversários políticos, instauram um regime onde a insegurança jurídica é a única certeza. E enquanto essa corte continuar a agir como um tribunal inquisitório moderno, o Brasil seguirá assistindo ao desmoronamento de sua democracia – uma decisão judicial por vez.
Com informações Folha de S.Paulo